Trabalho e realização: essência ou ilusão?

Nos últimos anos, a relação entre o trabalho e a realização pessoal tem sido alvo de grandes debates. A Casa do Saber recentemente publicou a frase: “O trabalho não precisa trazer realização pessoal. Mas será que isso é verdade?"

Em nossa sociedade, o trabalho frequentemente se confunde com a identidade, o que nos leva a questionar: o trabalho é realmente um reflexo de quem somos ou apenas uma necessidade prática? Ao mesmo tempo, essa pressão para encontrar realização no trabalho tem levado a um aumento de ansiedade e insatisfação, especialmente em um cenário global marcado por incertezas.

O trabalho molda nossa identidade social e influencia diretamente a maneira como somos percebidos pelos outros. Ser reconhecido e sentir-se valorizado no ambiente profissional é algo que pode gerar satisfação, ativando os circuitos de recompensa do cérebro, que está ligada à motivação e ao bem-estar.

Entretanto, quando essa busca por validação externa é constante, o resultado pode ser justamente o oposto: ansiedade, esgotamento e uma deterioração da saúde mental. A neurociência nos mostra que o estresse crônico no ambiente de trabalho pode impactar profundamente o cérebro. Nosso sistema nervoso, desenhado para reagir a ameaças de curto prazo, fica sobrecarregado quando exposto a metas excessivas, longas jornadas de trabalho e a falta de suporte. Esses fatores geram uma produção constante de cortisol, o hormônio do estresse, que afeta negativamente nossa capacidade de lidar com desafios e emoções, levando a quadros de ansiedade e depressão.

No Brasil, o psicólogo Jan Leonardi trouxe à tona dados alarmantes esta semana: o número de afastamentos por transtornos mentais cresceu 68% em 1 ano, refletindo o impacto das condições sociais e econômicas. A pandemia e suas consequências, como o luto, o isolamento, a insegurança financeira e a sobrecarga de trabalho, têm contribuído significativamente para esse aumento. Especialmente para as mulheres, que enfrentam uma combinação de menor remuneração, maiores responsabilidades familiares e o aumento da violência, as dificuldades no ambiente de trabalho se tornaram ainda mais desafiadoras.

Essa combinação de fatores revela uma realidade que muitos vivenciam: a realização ligada ao trabalho se torna um luxo, acessível para poucos, enquanto a maioria enfrenta um cotidiano de alienação. O trabalho, para muitos, é apenas uma necessidade econômica, dissociada de qualquer satisfação mais profunda.

Isso nos leva à questão: o trabalho precisa, de fato, trazer realização pessoal? Para alguns, o trabalho é uma extensão de sua identidade e uma fonte de orgulho. Para outros, é apenas um meio de subsistência. O que é claro é que a realização no trabalho está profundamente entrelaçada com expectativas sociais e valores. A satisfação pode ou não ser alcançada, dependendo do contexto individual e das condições de trabalho.

O quanto da sua identidade está ligada ao seu trabalho? Será que você está buscando validação externa para preencher uma necessidade interna? O que realmente te traz realização pessoal?